19 de junho de 2007

ALDENOR - O guerreiro partiu!...

Neste último domingo de junho, 17.06.2007, fui acordado pelo barulho do meu celular. Do outro lado da linha, Saraiva, um velho e estimado amigo, me deu a triste notícia do falecimento do nosso colega de trabalho, Aldenor Rafael. Ao desligar o telefone, já abatido com a perda de um colega e irmão, deitei outra vez e logo me veio na mente uma breve história que eu relato a seguir.

Eu cheguei à SUFRAMA na metade da década de 80 e vim para ser coordenador da coordenação de atividades agropecuárias, antiga COAP. Quando aqui cheguei, por força da minha formação e das atividades que eu exercia na empresa que acabará de sair, confesso que cheguei conseguindo pelo menos distinguir bem um boi de um pé de couve, o que decididamente não era o suficiente para comandar uma equipe formada por técnicos e engenheiros competentes e experientes do setor agropecuário da SUFRAMA.

Sem nunca ter sofrido qualquer tipo de resistência por parte dessa equipe, em pouco tempo eu passei a dominar as informações e o conhecimento do setor com muita naturalidade. Passei a falar do Distrito Agropecuário como se lá já trabalhasse há muitos anos. Tudo facilitado por conta de um grupo de pessoas (técnicos e engenheiros) que passaram a me olhar não só como chefe, mas com uma pessoa que demonstrava interesse em aprender, dividir os ônus e os bônus das atividades, e principalmente conquistar a amizade e o respeito de cada um deles.

Nas atividades de campo, especificamente, fiscalizando e acompanhando os projetos do Distrito Agropecuário, eu contava naquela época com os técnicos: Carlos Alberto, Arnoldo, Saraiva, Paulo Roberto, Aldenor e Flávio Augusto. Junto com eles eu palmilhei cada metro de estrada vicinal do Distrito Agropecuário, nos tempos em que sair para um trabalho de fiscalização, era muito mais do que cumprir com uma obrigação. Era uma missão arriscada, por conta das condições precárias das estradas, principalmente da BR-174, que dava acesso ao Distrito, porém ainda não era asfaltada. Se não era a poeira a secar nossas gargantas e embaçar a nossa visibilidade durante os deslocamentos, era a chuva, os buracos e a lama a nos exigir atenção redobrada, pois o perigo era permanente.

O dia-a-dia de trabalho no campo, que na medida do possível eu procurava sempre estar presente, era a única alternativa que eu tinha para me tornar tão bom quanto eles. Isso me levou a uma aproximação maior com toda a equipe. Nas horas de descanso, além das brincadeiras que nos ajudavam passar o tempo nos dias em que ficávamos trabalhando direto no campo, também tínhamos aqueles momentos dedicados a trocar idéias, contar das nossas experiências de vida e ouvir conselhos uns dos outros.

Dessa equipe de campo, da qual falo com muito orgulho e só guardo boas lembranças, quem nos deixou primeiro - a convite de Deus - foi o nosso colega Flávio Augusto, que conhecia a SUFRAMA desde o dia da publicação do decreto que a criou. Era só perguntar e ele contava a história por inteiro. Partiu do nosso convívio deixando muita saudade, boas lembranças e bons exemplos de vida. Apesar de ser o mais velho da equipe, tinha energia de sobra, era um brilhante contador de histórias, bom cozinheiro para uns e razoável para outros. Tinha o dom de infernizar (no bom sentido) a vida do grupo a hora que desejasse. Dizia ter orgasmo quando conseguia infernizar a vida dos engenheiros Eduardo Coutinho (já falecido) e Adão Ladeira, quando estes iam juntos a campo.

Flávio Augusto tinha como companheira inseparável, uma máquina datilográfica manual (pé duro) que carregava com ele para o campo. Quando ia para a Ilha da Marchantaria, onde as condições de trabalho eram mais difíceis naquela época, arrumava uma mesa qualquer, colocava debaixo de uma árvore, pendurava à altura das mãos um cacho de banana madura e, a cada cadastro realizado/datilografado, uma banana era caprichosamente traçada e degustada. Voltava de lá empachado, mas com os seus trabalhos e relatórios praticamente prontos com a ajuda da inseparável máquina.

Agora - atendendo o chamado de Deus - foi a vez de Aldenor Simões Rafael nos deixar. O bom e incansável guerreiro partiu. Lembro que em dado momento da sua vida, creio que no início da década de 90, foi alertado pelos médicos para um problema cardíaco que passou a lhe exigir cuidados especiais. Depois de muita luta, conseguiu apoio para viajar e buscar melhor assistência médica para o seu tratamento. Desse momento em diante, sempre teve consciência da gravidade do seu problema e dos cuidados que tinha que ter com a sua alimentação e medicação. Seguia todas as orientações e prescrições médicas e, por várias vezes, sempre bem humorado, me confidenciou que cuidava bem da saúde porque tinha muita vontade de viver e muitos planos ainda por realizar.

Na primeira vez que falamos desse assunto, Aldenor já estava acometido do problema cardíaco e era apenas um tecnólogo. Dizia que tinha o sonho de fazer uma faculdade e que ia batalhar para isso. Passado algum tempo, entrou na minha sala e timidamente disse-me:

– Chefe, vou começar o curso de engenharia florestal.

Era simplesmente indisfarçável a sua alegria e parecia estar ali para me dizer algo mais que a sua timidez não lhe permitia:

- Viu só cara! Eu falei que ia conseguir e consegui.

Daí para frente Aldenor sempre voltava na minha sala para trocar idéias, principalmente sobre o tema da sua monografia para a conclusão do curso. Eu tinha o prazer de recebê-lo em minha sala, não só por ser meu amigo, mas para observar a sua luta e determinação para concluir o trabalho e o curso de engenharia florestal. No dia da sua defesa, eu, com muito orgulho e satisfação, estava lá presente como um dos membros da banca examinadora.

Aldenor começou a sua apresentação sem disfarçar o seu nervosismo e timidez. Mas, aos poucos, foi relaxando e nos proporcionando uma verdadeira aula sobre o tema escolhido e que falava da terra, do chão, da mata, da vida, dos problemas e das alternativas para a melhoria de vida de famílias que vivem numa determinada área do Distrito Agropecuário da SUFRAMA. Exatamente o Distrito Agropecuário, que nós aprendemos a conhecer na palma na mão e onde começamos uma amizade que com o tempo nos tornou irmãos. E quando falo de irmãos, eu falo de todos que formavam aquela minha equipe de campo, pois é desta forma que eu os reconheço para sempre.

É importante dizer que além do curso de Engenharia Florestal, Aldenor também concluiu o curso de pós-graduação em Desenvolvimento Sustentável e ainda queria mais. Tinha sonhos e planos para 100 anos. Sabia das suas limitações em termos de saúde, mas a vontade de viver e de realizar fazia dele um guerreiro incansável. Um guerreiro que nunca foi abatido e que agora apenas descansa, atendendo a vontade de Deus. O meu amigo partiu. O bom guerreiro se foi. Descanse em paz!...
Emmanuel de Aguiar