11 de setembro de 2008

Reflexão sobre o exercício da cidadania em período eleitoral

Texto de Marilza de Melo Foucher

«Escolha e consciência são uma só e mesma coisa». Sartre-LÉtre et le Néant».

Em período de eleições municipais os políticos se lembram dos seus concidadãos e pedem votos, coisa normal para os candidatos. Todavia, é normal também para que o eleitor ou eleitora se informe e se prepare para escolher os candidatos. Saber, por exemplo, que tipo de mandato exerceu o vereador ou prefeito, verificando que atividades e projetos foram realizados em beneficio do município. Inclusive se informar se houve relação de transparência na aplicação dos recursos públicos, afinal ele é contribuinte do município, tendo em vista que enquanto cidadão ele paga os impostos e algumas taxas que irão se constituir em receitas municipais. O cidadão não é um consumidor dos serviços prestados pela municipalidade ou governo estadual, ou federal. Ele é um cidadão com direitos e deveres. Como concidadãos devem pagar os impostos corretamente e exigir que o orçamento público oriundo dos impostos possa ser aplicado com critérios e honestidade. Os governantes devem ser cobrados se as metas programadas nos planos não sejam cumpridas tendo em vista as verbas alocadas.

A vida política local foi sempre marcada por certos escândalos de desvios de dinheiro publico. Um dos exemplos corriqueiros é a falta de transparências nas licitações para execução de projetos de infra-estruturas urbanas e de certos serviços. Obras sem licitações ou certas maracutaias entre o poder econômico e político são fatos banalizados por muitos concidadãos. Sabe-se que no passado os maiores atos de corrupção se davam nesse domínio. Sabe-se também que existem vereadores e fiscais públicos que por vezes fecham os olhos ou são cúmplices de corrupção. A corrupção é a enfermidade de maior contágio na esfera publica e seu tratamento é recente, faz poucos anos apenas que ela vem sendo cuidada com mais atenção, todavia, sua cura depende muito do comportamento de cada cidadão. Enquanto cidadão, você tem o direito a exercer o controle social e saber a destinação dos gastos públicos. A constituição brasileira assegura, por exemplo, ao contribuinte cidadão o direito de exigir transparência dos gastos públicos no plano municipal. As contas dos municípios ficarão, durante sessenta dias, anualmente à disposição de qualquer contribuinte, para exame e apreciação, o qual poderá questionar-lhes a legitimidade nos termos da lei.

Lamentavelmente são poucos os que participam no fortalecimento da democracia do poder local. Eleger alguém quer dizer exercer um poder de escolher os ocupantes temporários do governo. A democracia é fundada na noção dos direitos entre governados e governantes. Daí a exigência de vigilância do poder político. As desigualdades sociais se expressam também desigualdades de poder. A participação dos cidadãos organizados nos conselhos municipais pode, por exemplo, ser sano para o combate à corrupção e qualquer abuso de poder.

O ideal seria em período pré-eleitoral de poder contar com a imparcialidade da mídia local e nacional, existem analistas políticos exercendo a profissão de jornalista, que poderiam contribuir na formação política dos cidadãos. Existem questões elementares que poderiam alimentar vários debates nas rádios e televisões, além de publicações de entrevistas com os candidatos. Mas o cidadão ou cidadã pode e deve também saber que projetos de lei foram elaborados pelos vereadores e executados pelo prefeito para melhorar a qualidade de vida na cidade. Que propostas alternativas, inovadoras apresentam os novos candidatos. Qual a trajetória profissional e política dos candidatos que estão solicitando um mandato eletivo para assumir o governo local?

As eleições para os governos municipais representam uma das mais importantes do país, onde os cidadãos se sentem mais concernidos. Trata-se evidentemente da gestão do quotidiano de milhares de eleitores(as) que vivem em cidades pequenas, médias, grandes e cidades metropolitanas. Será nesse chamado espaço urbano que a cidadania é exercida, onde os direitos e obrigações formam a base comum para uma vida civilizada. É localmente que se buscam as soluções para assegurar um desenvolvimento territorial integrado com sustentabilidade. Daí o papel fundamental da mídia comprometida com a verdadeira política, seria de alertar e contribuir para o fortalecimento da educação cívica nesse período. Ainda é tempo de se exercer a cidadania política que vai além do direito de votar. O cidadão e cidadã podem se informar melhor antes de escolher o prefeito e vereadores. Sobretudo se o prefeito e vereadores se apresentam para um segundo mandato.

Ao longo de quatro anos de mandato, por exemplo, que atividades e projetos foram realizados na área de saneamento básico, a rede de distribuição de água foi expandida? A qualidade no tratamento da água melhorou? Os esgotos de águas usadas e pluviais correspondem ao crescimento hoje da cidade? Que projetos de drenagem de igarapés, despoluição de rios (entre outros) foram implementados? Que exigência foram feitas junto às construtoras imobiliárias na preservação dos espaços verdes? Que investimentos foram feitos na área de habitação com finalidade social, destinados às famílias de baixa renda? Quantas praças arborizadas foram instaladas ou recuperadas? A pavimentação das ruas obedeceu a critérios de qualidades prevendo duração de longa vida com manutenção prevista todos os anos antes dos períodos de chuvas? As calçadas foram recuperadas? Os espaços destinados aos pedestres são suficientes para passeios com crianças e para pessoas idosas?

Como funciona hoje o serviço de assistência social municipal? Que tipos de serviços? Que investimentos foram feitos na área cultural? Quantas bibliotecas foram instaladas nos bairros? Quantos cursos de pintura, artesanato, de musica e outros são financiados pela prefeitura para populações de baixa renda ou classe média?

Quanto à preservação e melhoria dos ecossistemas urbanos o que foi feito? Existem campanhas nas rádios e televisão para educar o cidadão(ã) sobre esta questão? Nas escolas da rede municipal os professores foram formados para educar os alunos sobre o meio ambiente? A rede educação municipal contribuiu para melhorar a qualidade do ensino? Quantos professores municipais receberam formação pedagógica para desenvolver melhor o programa escolar? Que estímulos foram dados para a criação de trabalho e renda nas periferias da cidade? Sem contar outras prioridades básicas ligadas à saúde publica e ao bem-estar dos concidadãos.

Finalmente governar uma cidade, significa ter uma visão global para por em pratica um desenvolvimento territorial integrado e sustentável. Os vereadores e o prefeito devem pensar a cidade como um todo e devem agir de modo mais articulado com os organismos estaduais e federais objetivando a criação de cidades mais humanas, mais fraternas, combatendo de fato todas as formas de violência e exclusão.

O bom político quando eleito deve ter o balanço das ações negativas e positivas do prefeito anterior e dentro do espírito de homem publico, ele deve dar continuidade aos projetos e atividades considerados benéficas para a população evitando assim o desperdício do dinheiro publico investido. Quanto ao vereador, ele é reconhecido em suas responsabilidades de co-gestão e de controle face ao poder executivo. Com o Prefeito, a Câmara elabora decisões aplicáveis localmente. A Lei Orgânica de toda municipalidade deve precisar os objetos de sua competência legislativa e seu papel de adotar os programas gerais e o Orçamento Municipal. O poder legislativo é competente para votar as resoluções referendarias, para aprovar, autorizar ou elaborar pareceres independentes daqueles preparados pelo executivo municipal. A Constituição também atribui competências para o poder legislativo exercer o controle das finanças municipais com o auxilio do Tribunal de Contas dos Estados ou dos municípios se houver. Vários mecanismos são previstos: solicitação de informações ao Prefeito, convocação de assessores diretos deste, instalação de comissões de inquérito, requerimento de exame de contas da municipalidade... Enfim, o poder Legislativo Municipal tem a tarefa de julgar a política do Prefeito em casos de infrações político-administrativas.

10 de setembro de 2008

MENINA BRUNA!

O jornal A CRITICA do dia 05.09.2008 trouxe uma matéria sobre as circunstâncias da morte da menina BRUNA. É algo profundamente chocante e que não pode jamais cair no esquecimento da sociedade amazonense, como tem acontecido com tantos outros episódios dessa natureza. Se não reagirmos com toda a indignação que o caso merece, amanhã corremos o risco de estar sofrendo na própria pele a dor dilacerante da perda de um filho ou de um ente querido, como aconteceu desta feita com os pais de Bruna. Faço inclusive um apelo ao jornal A CRÍTICA, no sentido de que acompanhe de perto essa questão (dure o tempo que tiver que durar), até que a verdade prevaleça e, se houver condenados, que o processo não venha a mofar até ser arquivado, livrando assim os culpados de cumprir as suas penas.

Não estamos aqui para condenar ninguém antecipadamente. O que não dá mais é ficarmos aceitando o uso da “fatalidade” como desculpa para mortes absurdas. Como também não dá mais para assistir o anúncio de arquivamento de processos judiciais, onde condenados por erros médicos não pagam suas penas. Isso tudo tem um nome que já tornou o Brasil uma referência mundial – impunidade! É hora de reagirmos. Chega de omissão ou a próxima vítima pode estar na nossa própria família. Eu não quero jamais passar por essa dor e vou tentar fazer a minha parte.

Diz o jornal que a menina BRUNA sofreu uma parada cardíaca não detectada pelos aparelhos. Ora bolas! Que porcaria de aparelhos são esses? Que tipo de hospital é esse que disponibiliza ao médico num procedimento cirúrgico, equipamentos que não funcionam ou que não oferecem segurança aos médicos e pacientes? Se é que foram os aparelhos que falharam no caso da menina Bruna, eu pergunto: onde estão esses supostos aparelhos usados na cirurgia? Porque não funcionaram? Por acaso já foram retirados e lacrados para uma perícia, ou será continuam no mesmo lugar e servindo de apoio a outras cirurgias? Quantos outros médicos e vítimas fatais vão ser traídos por esses equipamentos até que sejam periciados?

O jornal diz que o médico estava fechando os últimos pontos da garganta, quando percebeu que o sangue mudou de cor e ficou mais escuro. Muito estranha essa afirmação. E os aparelhos? Quem estava monitorando os equipamentos? O que fazia exatamente o anestesista que não percebeu coisa alguma? Quanto tempo já teria se passado até que o médico constatasse que o sangue havia mudado de cor e a criança já estava roxa? Como é que um médico, dito experiente, acompanhado por um anestesista, uma enfermeira e mais o apoio de equipamentos normais de qualquer cirurgia, não perceberam coisa alguma a tempo de salvar a vida da criança? Pensando bem até já se sabe de quem vai ser a culpa – é dos equipamentos que estavam ligados, mas que inexplicavelmente não registraram coisa alguma de errado. Pela morte da criança, é óbvio, vão querer nos convencer mais uma vez de que a culpa é da fatalidade – a eterna e manjada fatalidade.

A matéria do Jornal A CRITICA, pasmem, afirma terem tido acesso ao relatório da Fundação de Vigilância em Saúde (FVS), onde são apontadas 24 irregularidades no Hospital onde Bruna foi operada. Diz mais ainda, ou seja, que o relatório está ricamente ilustrado. Diante dessa informação, qualquer cidadão vai querer saber por que o centro cirúrgico continuou sendo usado pelo Hospital e pelos médicos? Será que o relatório apenas ilustra ricamente as irregularidades do Hospital, mas em momento algum impedi ou recomenda a não utilização do centro cirúrgico? Que irregularidade são essas que não impediram o uso do centro cirúrgico?

Como a FVS está citada na matéria, entendo que fica no dever de esclarecer essa situação à sociedade, sob pena de acharmos que as inspeções que realizam não são levadas a sério pelos Hospitais. São ou não são? E aí – como é que fica? Qual será a situação real dos demais centros cirúrgicos espalhados pelos Hospitais de Manaus? Quem se digna a dar essa informação, em nome da tranqüilidade das pessoas que estão na expectativa de realizar um procedimento cirúrgico? Por enquanto só uma sugestão – fiquem longe do centro cirúrgico do Hospital São Lucas.

Outra informação absurda na matéria de A CRITICA, diz respeito à enfermeira que supostamente participava da cirurgia da menina BRUNA, e que saiu da sala de cirurgia a procura de um aparelho usado para reanimação - o desfibrilador. Pelo amor de Deus! Não dá para acreditar numa cena dessas. No atual contexto, um centro cirúrgico de um Hospital dentro da cidade de Manaus, sem um desfibrilador, é caso de polícia. É omissão grave! É negligência pura! É falta de respeito com a vida alheia! É cadeia!

O médico responsável pela cirurgia fez uma declaração no mínimo curiosa para o jornal A CRITICA. Disse ele que as “paredes não falam”. Lamentavelmente não é só isso! Elas também não registram nada, tampouco podem servir de testemunhas para nos ajudar a impedir que coisas absurdas continuem acontecendo em salas de cirurgias e que ficam sem explicações pelo resto da vida. O azar é de quem morre. A dor fica para os que perderam seus entes queridos por culpa da negligência, da omissão e da imperícia de maus profissionais, acobertados pela eterna impunidade.

Para acabarmos com isso a sociedade tem que se indignar e se mobilizar para fazer as cobranças devidas. Cobrar para valer! Já que estamos em eleição, é hora inclusive de cobrar do futuro prefeito e dos futuros vereadores, que honrem não só os votos recebidos, mas as próprias calças, não se omitindo nem se acovardando de fazer o que precisa ser feito. Por último quero mandar duas mensagens: uma mensagem para o Ministério Público Estadual, onde o jornal informa que os pais de BRUNA registraram um pedido de instauração de inquérito – não nos decepcionem! A segunda mensagem vai para o Conselho Regional de Medicina Local – ajudem-nos a nos proteger (em tempo hábil) dos péssimos Hospitais e dos maus profissionais. A sociedade agradece!