CAPITULO I - A IDA
Certa
oportunidade, eu, José Jorge Junior, Amanda Saraiva e Adamilton Mourão, fomos pela estrada AM-010 até Itacoatiara executar
um serviço.
Antes de contar essa odisseia, quero explicar o motivo da escolha dessa foto que coloquei para ilustrar o texto. Ela tem uma importância afetiva para mim, como amante da natureza. Durante uma época, foram inúmeras vezes que fui para Itacoatiara passar fins de semana. Avistar essa bela seringueira na margem da pista, era o sinal de que estávamos chegando na Velha Serpa. Há muitos anos não vou a Itacoatiara e a informação que tenho é que a bela seringueira já não estaria mais lá.
Dito isso, para contar o
que de extraordinário aconteceu nessa viagem à Velha Serpa, vou
simplificar os nomes dos personagens: José Jorge Junior é o Jorjão, a Amanda
Saraiva é a Amandinha, o Adamilton Mourão é o Dadá, e o motorista da viatura, que não recordo o nome, é
o Motora.
Nessa viagem, lembro
que era importante levarmos uma máquina fotográfica digital. Precisávamos fazer
uns registros fotográficos para constar no relatório. Nessa época, esse tipo de
equipamento de fotos digitais ainda não era tão comum. Apenas a unidade onde Dadá trabalhava
tinha uma máquina digital disponível e essa ficava sob seus cuidados.
Fui então falar
com Dadá sobre a possibilidade de nos emprestar a máquina. Para surpresa, em
lugar de nos emprestar a máquina, Dadá se incluiu na viagem. Argumentou que ia
aproveitar a oportunidade da nossa ida para fazer o acompanhamento e
fiscalização de um projeto em Itacoatiara sob sua responsabilidade. Como havia
espaço na viatura, concluímos a conversa acertando a data e a hora para sairmos
de Manaus.
A caminho da
Velha Serpa, ainda no trecho entre Manaus e Rio Preto da Eva, passamos por um
momento de aperto. Caiu um pé-d’água na estrada com raios e trovões
assustadores. O motora, mesmo já familiarizado com a estrada, dirigia a viatura quase que parando. A visibilidade era precária
e reinava o silencio entre os viajantes. Até Dadá, sempre muito gaiato e conhecido
pela sua tagarelice incontrolável, mantinha-se quietinho no seu lugar.
Em dado
momento desse pé-d’água, tocou o meu celular. Eu atendo e a pessoa do outra
lado pergunta: - É o Dr. Emmanuel? Sim, sou eu, respondo.
Logo em
seguida a linha cai e não houve diálogo. Minutos depois o celular toca outra
vez.
- Dr.
Emmanuel, a linha caiu. Vou passar agora.
Na conversa, fui
respondendo as perguntas e explicando o objetivo da nossa missão em Itacoatiara.
O motivo da ligação inesperada era esse. Lembro que em determinado momento da conversa citei
o nome de Dadá para explicar que a sua missão naquela viagem tinha um objetivo
diferente da nossa. Estávamos apenas otimizando o uso da viatura e de
equipamento, como era recomendado.
Ao ouvir o
seu nome citado na conversa, e sem entender do que se tratava, Dadá, que até
então ia quietinho no seu lugar, começou a dar sinais de surto psicótico dentro
da viatura. Enquanto eu falava ao celular, ele fazia gestos estranhos com a
boca e os beiços em minha direção. Curioso que é até o tucupi, o surto foi aumentando
e aí Dadá passou a se coçar todo, arregalava os olhos, engelhava a cara, espremia
os cravos do nariz e depois cheirava.
O Jorjão e a Amandinha,
viajando lado a lado com Dadá no banco de trás da viatura, já estavam
acostumados com os tiques nervosos de Dadá, principalmente o de espremer cravo
do nariz e cheirar. Uma coisa meio que nojenta e obscena ao mesmo tempo. Já o
motora, coitado, esse não disfarçava o seu pane. Um olho na estrada, outro no
retrovisor interno vendo o Dadá surtar no banco de trás. Na cabeça dele, ele havia sido convocado para dirigir
uma viatura rumo a Itacoatiara e não uma ambulância no rumo do hospício.
A minha conversa
ao telefone, para desespero de Dadá, durou uns cinco minutos. Ao final, eu
tinha recebido a ordem de passar uma informação para Dadá, e foi o que eu fiz:
- Seguinte
Dadá, apesar da solicitação do teu chefe ter seguido os trâmites, mandaram eu lhe
avisar que a sua diária não foi e não vai ser debitada para essa viagem.
Vencida a
curiosidade, Dadá já reage à notícia falando em auto defesa e usando de
chantagem emocional: - Oh, como assim! Não tô entendendo! Como não! O que foi
que eu fiz? Como é que fica? Eu vou, eu volto? E a máquina, como é que faz?
Em resumo, como
chefe daquela missão, eu tinha que dar uma solução e só haviam duas alternativas
naquele momento. Uma era voltar para deixar o Dadá. A outra, era nos
solidarizarmos com o colega, levá-lo junto para executar a sua missão em
Itacoatiara e bancar as suas despesas, já que havia ficado sem a diária. Mas,
como se tratava de Dadá, tinha que ter uma contrapartida. Decidimos que ele, ao
chegarmos no Hotel, faria a negociação com o gerente para conseguirmos um quarto
suíte, com ar condicionado, frigobar, desconto, e 4 camas para que todos
ficássemos juntos.
O motora,
vendo-se incluído no quarto suite, reagiu na hora:
– Eu não doutor! Precisa não doutor! Eu tô
levando a minha diariazinha que dá para os meus gastos. Só faltou dizer – faz
isso comigo não doutor! Era nítida a cara de preocupação do motora diante da
possibilidade de ser colocado para dormir dentro do mesmo quarto com o Dadá,
depois de tudo o que ela já havia presenciado dentro da viatura.
Aí, para deixar
o motora ainda mais aperreado, Dadá resolve apelar:
- Acalma esse
coração motora. Você vai sim ficar junto conosco na suíte e ainda vai dividir o
beliche comigo. Um por todos, todos por um. Foi o suficiente para o motora não
dar mais uma palavra a viagem toda.
Aliviado com a
solução dada para a sua continuidade na viagem, Dadá recuperou o humor e foi o
resto do itinerário curtindo a cara de todos e repetindo que ia dividir o
beliche com o motora. A cada vez que voltava ao assunto, ele perguntava do
motora:
- Quer ficar
na cama de cima ou na cama de baixo?
- Tem
preferência por cima ou por baixo?
Haja paciência!
CAPITULO II - A NEGOCIAÇÃO
Chegando no
hotel em Itacoatiara, descemos com as
nossas mochilas e Dadá já saiu na frente para negociar o quarto suíte para
4 pessoas, conforme havíamos combinado.
No balcão de
recepção do hotel estava uma pessoa ainda bem jovem e comunicativa.
Dadá deu boa
tarde ao jovem, olhou sério para ele e perguntou:
- Você é o
gerente?
- Não, não
sou não senhor.
Como não! É
seu coração que está dizendo isso? O meu
coração está dizendo que você é o gerente deste estabelecimento – insistiu Dadá
com o recepcionista.
Sou não
senhor – repetiu o jovem, mas insiste Dadá.
- Liberte esse
coração meu gerente e nos arrume uma suíte com ar condicionado para 4 pessoas.
Quando Dadá falou
em suíte, o rapaz já completou:
- Senhor, a suíte
que nós temos disponível só tem uma cama de casal, um beliche e a diária é de
120 reais no dinheiro.
- Ótimo! Sem
problema meu gerente. Você agora só precisa providenciar mais uma cama de
solteiro e a gente fecha tudo em 80 reais a pernoite. E, sem deixar o
recepcionista acrescentar mais nada, pediu a chave e fez ele nos levar até o
apartamento suíte.
O quarto era bem arrumadinho para o padrão do hotel,
faltando apenas a cama de solteiro, que chegou rápido e foi colocada para o
motora ao lado da porta de entrada. A cama de casal, ficou acordado que ficaria para
o chefe, no caso, eu, e no beliche ficariam o Dadá na cama de cima e o Jorjão na cama de baixo.
Assim , o acordo de
conseguir uma suíte para 4 pessoas estava cumprido pelo Dadá. A dúvida era se
na saída íamos pagar 120 ou 80 reais. Mas, como era de se esperar, Dadá com a
sua lábia afiada de sempre, conseguiu na saída fechar a diária em 80 reais e
ainda levar na mochila o que coube do café da manhã – até ovo cozido.
CAPÍTULO III - O JANTAR
A noite foi chegando e a
fome foi apertando. Reunimos na recepção do hotel e decidimos ir juntos jantar
no mesmo lugar. De outra forma, alguém ia ter que bancar sozinho a fome
canina de Dadá. Fomos parar num restaurante
tradicional da cidade que fica de frente para rio.
Pedimos o
cardápio para olhar os pratos e os preços. A preocupação não era o fato do Dadá
não entrar na divisão das despesas, mas o fato dele ter a cara de pau
suficiente para ser o primeiro a atacar os pratos na hora de servir.
Demos
preferência por peixe e escolhemos comer um Surubim. Pedimos dois pratos para
servir 5 pessoas. A garçonete nos garantiu que vinham 2 pedaços de peixe bem
servidos. Numa divisão simples, seria um pedaço para cada um dos que tinham
diária para dividir a despesa. Dadá estava fora dessa divisão e teria que
negociar um pedaço a mais de peixe por cortesia da casa.
A tentativa de
Dadá começou com a garçonete, mas não logrou êxito. Foram várias as investidas
frustradas. Não conseguiu convencer a garçonete de que no coração dele, ela era
a proprietária do estabelecimento e mandava na cozinha.
Só restava ao
Dadá ir negociar com a proprietária do estabelecimento. De longe ela já estava de
olho nas investidas do Dadá para cima da garçonete. Ela só não imaginava que
seria a próxima vítima do predador.
Sem saída, lá
foi Dadá encarar a proprietária. A conversa durou por volta de meia hora.
Falava, gesticulava de todo jeito, arregalava os olhos, mordia os beiços e apontava
para a nossa mesa. A proprietária, de cara amarrada, não mexia nem a
sobrancelha. Com certeza já estava acostumada com aquele tipo de cantada furada
por comida.
Vendo que não
tinha como se livrar de Dadá, a proprietária concorda em mandar incluir mais um
só pedaço de peixe num dos pratos e ele volta para a mesa cantando vitória.
Os pratos chegam
bem servidos. O peixe estava saboroso e o jantar foi dos melhores.
Terminado o jantar, continuamos
conversando à mesa para fazer a digestão e depois voltarmos ao hotel para
dormir.
De repente,
somos surpreendidos com uma cena de filme de pastelão – impagável!
Dadá dá um
salto mortal, pula para cima da cadeira e começa a gritar:
- Olha a Barata!
Olha a Barata! Barata! Tenho nojo! Barata! Barata!
Ficamos estatelados.
Um marmanjo em cima da cadeira, sapateando com medo de uma baratinha cascuda
indefesa. Pior! Só desceu da cadeira quando Amandinha convenceu a ele que a
barata tinha se suicidado, correndo dele e se atirando no rumo do barranco da
beira do rio.
O motoro, que
já havia presenciado um surto do Dadá na estrada, comentou baixinho comigo: -
Égua, doutor! Esse destrambelhado é histérico também: barata! barata! barata! hum!
Depois daquela
cena e do comentário sarcástico do motora,
resolvi pedir a conta, antes que a masculinidade de Dadá fosse jogada
barranco abaixo junto com a barata. Até a garçonete, preocupada com o Dadá
insistia:
- O senhor
quer que eu pegue um copinho d’água com açúcar?
Levantamos da
mesa e, enquanto caminhávamos para a saída, dava para perceber os clientes nas mesas nos seguindo com o rabo do olho, como que dizendo:
– Lá vai ele!
Lá vai ele! Humhum
CAPITULO IV - A ARMADILHA
No caminho de
volta do restaurante para o hotel, só Dadá falava na viatura, tentando explicar
o surto da barata. Como não conseguia convencer ninguém, Jorjão deu a
explicação mais convincente.
- Fica frio
Dadá! Isso com certeza é trauma de uma alguma reencarnação passada.
Só o motora
completou a explicação – E né! Hum!
Chegando no
hotel eu lembrei que tinha um documento longo para ler e criticar. Resolvi
dedicar pelo menos uma hora para essa leitura. Peguei o documento e fui para a
área de recepção fazer a leitura. Já cansado da viagem, não consegui ir muito
longe no exame do documento e resolvi ir dormir.
Quando eu
entro no quarto, estava um breu. Não dava para ver absolutamente nada. Todos
aparentemente dormindo. Decidi não ligar a luz para não incomodar. O dia tinha
sido cansativo para todos.
Fui tateando em
direção da cama de casal que tínhamos pactuado que seria a minha. Chego perto e
vejo, surpreso, o Jorjão atravessado na cama, de bruços, e um dos braços como
que escondendo a cara.
Na cama de
solteira estava o motora e na cama inferior do beliche estava o Dadá, deitado
do mesmo jeitinho que o Jorjão, de bruços, e com um dos braços como que escondendo
a cara.
Só me restava
a cama superior do beliche para dormir, o que não havia sido o acertado.
Fui em
direção ao beliche. Chegando perto observei que não havia mais
a escada para me ajudar a subir para a cama superior. Estava faltando a
escadinha que eu lembrei bem ter visto quando entramos pela primeira vez no
quarto.
Daí então, comecei
a desconfiar que eles tinham preparado uma armadilha para mim. A cama superior do
beliche era um pouco alta e, como não tenho muita altura, o esforço para subir ia
exigir um pouco de malabarismo. Confesso que foram várias as tentativas até eu conseguir
subir para a cama.
Enquanto eu
fazia esforços para subir na cama, Dadá e Jorjão tentavam, sem sucesso, se
passarem por mortos. Tossiam descaradamente que nem tuberculoso tentando
disfarçar a vontade de rir com a minha dificuldade de subir no beliche. O motora,
acordado desde a hora que entrei no quarto, e com certeza sem ter participação
naquela sacanagem, vendo as minhas dificuldades, resolveu quebrar o silencio e oferecer
a cama dele para eu dormir. Agradeci a gentileza e continuei insistindo em
subir no beliche.
Na verdade não
imaginava que o pior ainda estava por vir. Depois que consegui subir no
beliche, dei conta que a cama estava bem de frente para a boca do aparelho de
ar condicionado. Agora, já lá em cima, eu só tinha duas opções: escolher a
minha careca ou a sola dos pés para ficar de frente para a boca do aparelho. Se
não bastasse isso, simplesmente não havia um cobertor para eu me cobrir. Apenas uma toalha de banho, que felizmente não
foi usada e eu pude usar como cobertor dos pés frente a boca do ar
condicionado.
Em resumo, a
armadilha que preparam para mim deu certo. Armaram e conseguiram me pegar direitinho
naquela noite. Como sou um bom jogador, ponto para eles. Só me restava tentar
dormir e pensar como seria a vingança que, para a minha alegria, não durou 24
horas para acontecer.
CAPÍTULO V - O CLONE DO REI
Para as
visitas que tínhamos a fazer na Velha Serpa, uma pessoa foi nos acompanhando.
Como não
havia espaço para todos dentro da viatura, Dadá se dispôs a ir junto com essa
pessoa na carroceria.
Lá pelas
tantas, olhamos para trás e lá está o Dadá, com a máquina digital na cara e a
outra pessoa sentada na beira da carroceria, passando a mão nos cabelos e
fazendo poses como se estivesse bancando o modelo fotográfico. Instantes depois, olhamos e
os dois estavam cantando alguma coisa e Dadá continuava fotografando. Ficamos
desconfiados daquelas cenas, mas, como Dadá faz amizade fácil, achamos que ele
havia conquistado a simpatia daquela pessoa que nos acompanhava nas visitas.
Bom para nós!
Na parada
para o almoço, Jorjão resolveu perguntar do Dadá reservadamente:
- Tu estavas
batendo foto do que Dadá?
- Do Roberto
Carlos - respondeu.
- Deixa de
putaria Dadá!
- Que putaria
que nada. Tu não tá vendo não. O cara é a cara do Rei Roberto Carlos.
Simplesmente aconteceu que
Dadá, tentando agradar o nosso interlocutor, foi dizer que ele era muito
parecido com o Rei Roberto Carlos. Em resposta, ele feliz agradeceu dizendo que muita
gente na cidade lhe dizia exatamente a mesma coisa.
Sem perder o
embalo, Dadá insistiu e ainda arrancou dele a confissão de que além de ser
parecido, era fã de carteirinha do Rei. Tinha todos os seus discos em casa e
cantava as suas músicas. Aí foi quando Dadá pediu para ele cantar as músicas,
aproveitando para fotografar e fazer o papel de backing vocal do Rei Roberto
da Velha Serpa.
Não sabemos
se houve desdobramentos dessa história. Se houve um reencontro do Dadá com o
Rei Roberto da Velho Serpa para novos ensaios, ou se pelo menos Dadá teve a
consideração de mandar as fotos do ensaio fotográfico com o Rei, feitas na
carroceria da viatura.
CAPITULO VI - A VOLTA
Saímos do
hotel na parte da tarde, rumo a Manaus. Já
na saída da cidade de Itacoatiara, Dadá começou a aprontar das suas. Perguntava
se todos tinham dormido bem, pois ele tinha dormido que nem um anjo. Amandinha,
que não estava sabendo de nada, foi a única a responder dizendo que também tinha
dormido bem. Os outros todos, inclusive o motora, deram só aquele sorriso
maroto e desconfiado.
Dadá na
verdade queria puxar assunto para explorar o que fizeram comigo na madrugada.
Queria saber se alguém tinha ficado correndo e querendo pular para cima do
beliche sem usar a escada. A brincadeira foi crescendo e virou gozação e muita gargalhada.
Até o motora, que havia sido solidário comigo oferecendo a cama dele para eu
dormir, batia no volante de tanto rir. Eu senti que tinha entrado na berlinda e
isso ia durar a viagem todo. Mas, como já disse, sou um bom jogador e só me restava
rir junto e esperar a minha oportunidade de vingança.
Passamos a segunda
ponte e Dadá não parava de falar a mesma coisa e a turma não parava de dar
gargalhadas. O tempo foi fechando na estrada e, de repente, começou a chuviscar.
Lembrei que nossas bolsas estavam todas na carroceria. O chuvisco engrossou e
aí eu pedi para o motora parar no acostamento para que pudéssemos colocar as
nossas bolsas dentro da viatura. Foi aí então que veio a surpresa e o desfecho
para a minha vingança. A minha bolsa não estava na carroceria.
Quando nos
reunimos na recepção do hotel para sairmos, eu estava com a minha bolsa. Dadá
se aproveitando de um momento de desatenção minha, escondeu a bolsa. Na hora de
ir para a viatura, não vendo a bolsa em cima da cadeira onde havia deixado,
achei que alguém já havia pego e levado para a viatura. Não me passou pela
cabeça me certificar disso.
Depois de
vasculharem o carro todo e não acharem a minha bolsa, começaram as sugestões
desconfiadas: - Chegando em Rio Preto da Eva a gente liga para o Hotel e pede
para alguém colocar no ônibus e depois a gente pega lá em Manaus. Eram tantas
as sugestões que nem me deixavam falar.
Enquanto eles
davam suas sugestões para a situação que haviam criado, fui lembrando de
algumas coisas do momento da nossa saída de Itacoatiara, ainda na recepção do
hotel. Jorjão ligou para a namorada e Dadá marcou para sair com a esposa assim
que chegassem. Dadá exigiu inclusive que a esposa estivesse pronta quando ele chegasse.
Lembrando desses detalhes, decidi que era a hora da minha vingança. Olhei para
o motora e determinei:
- Vamos
voltar para resgatar a minha bolsa.
A revolta foi
generalizada: – É um absurdo voltar daqui! Já estamos próximos de Manaus! Estamos
cansados demais!
Até o motora,
que vinha dando gargalhadas batendo no volante, resolveu tentar me desmotivar:
- Doutor, a gasolina
não vai dar.
Retruquei -
vai dar sim senhor. Pare na primeira bomba do caminho, mande encher até o talo que
eu pago.
Convencidos
de que eu não mudaria de ideia, o motora ligou o carro, deu meia volta e
retornamos até Itacoatiara para pegar a minha bolsa. Nenhuma palavra mais.
Nenhuma gracinha mais. Ninguém falava nadica de nada. O motora, de pescoço duro,
olhava só no rumo da estrada. Atrás, Dadá e Jorjão se mexendo para tudo quanto
era lado querendo arrumar um jeito para tentar um cochilo. O Dadá não tinha
mais cravo para espremer nem cheirar. O Jorjão não arrumava jeito de esticar
metro e meio de pernas.
Chegando em
Itacoatiara, peguei a bolsa, dei só mais 5 minutos para esticarem as pernas e
voltamos. Foi a viagem mais silenciosa de toda a minha vida. Eu até que insisti com o grupo
por alguns instantes:
- Vamos lá
gente! Qual é a próxima piada. Dadá, não se amofina não, continua aí a história
da escada do beliche. Motora, larga uma piada aí. JorJão, tá muito apertado aí
atrás?
Enfim, a
minha vingança acabou vindo mais rápida do que eu e eles pudessem imaginar. Foi
o êxtase!