28 de dezembro de 2006

A Batalha pela Presidência (CMM)

Desde criança eu ouvia o meu avô falar que na política tudo é possível e imaginável. Ingênuo naquela altura, certo dia eu disse a ele:
- Explica melhor esse negócio aí!
E ele me respondeu com outras perguntas:
- Você já viu boi voar? Jacaré nadar de costas? Jabuti dormir em árvore?
Com o tempo fui entendendo. O exemplo mais recente disso tudo aí é a eleição para presidente da Câmara Municipal de Manaus. Nada diferente das outras eleições, mas oportuna para uma leve e descontraída reflexão sobre as coisas que aí estão acontecendo.
Pergunto: será que alguém imaginava que de repente acabaria eleito para presidente da Câmara, o vereador que mais críticas tem feito ao desempenho da administração pública? Venceu inclusive o fiel e incansável escudeiro do alcaide, que parecia estar vencendo fácil, mas foi implacavelmente abatido a um minuto do apito final.
Pois é! Foi ele mesmo o escolhido, eleito com as bênçãos do alto clero e do baixo clero, e certamente com o compromisso de servir bem a todos, inclusive o povo - pobre povo - que junto com os nobres vereadores, coitados, ultimamente não estão conseguindo mais nem emplacar uma emendinha no orçamento.
A verdade é que fica difícil explicar para as pessoas como é que essas coisas esdrúxulas acontecem. Como se vai explicar o que não tem explicação? Daí os políticos terem descoberto a palavra “dinâmica”, que agora explica tudo, inclusive jabuti plantado em árvore.
- Excelência, o senhor poderia explicar aquele jabuti na árvore de natal dos senhores?
- É a dinâmica meu filho. Você tem algo contra?
- O que isso doutor! Tô só querendo entender. Se avexe não!...
Mas tudo isso acontece desse jeito e dando motivos para mil interpretações, simplesmente por que só se preocupam com a tal dinâmica do poder e se esquecem da transparência, que no fundo deveria ser o exercício permanente de qualquer parlamento. O que se vê hoje é a quase meia transparência. O que é conveniente – a ordem é escancarar. O que não é conveniente – mascara que o tempo passa e o povo esquece.
Isto significa que o povo acaba não tendo acesso ao que de fato acontece nos bastidores de uma batalha infernal como essa de eleger um presidente de uma Câmara Municipal, principalmente em se tratando de uma cidade cuja arrecadação é o sonho impossível de mais de 90% dos prefeitos desse país de tantas mazelas e desigualdades.
A única coisa que se sabe, segundo os próprios atores desse processo, é que nesse tipo de batalha acontece de tudo um pouco: tapas e beijos, chutes, caneladas, pernadas, traições, etc. E quando a coisa pega mesmo para valer, pode terminar até em soluços compulsivos (que normalmente não é de emoção, muito menos de alegria) e alguns prejuízos financeiros para o bolso do contribuinte (equivalentes a uns cargozinhos a mais para honrar pequenos arranjos de última hora).
Na falta da tão sonhada transparência, as pessoas acabam criando as suas próprias interpretações. E mesmo que os políticos tentem explicar, acabam desacreditados, pois agora tudo - certo ou errado - é culpa da tal dinâmica da política. E é por esse caminho que eles conseguem iludir muita gente e dar explicações de tudo, seja do bem ou do mal.
No caso recente da eleição da Câmara, a impressão que ficou é que existia um Leão atrapalhando o ritmo da casa e esse era o momento de acalmar a fera. O Leão, salvo melhor juízo, deu a entender que está feliz com o novo cargo; que não se deixará domar facilmente; e que vai continuar fazendo barulho quando for preciso. Mas como ninguém sabe o que rolou nos bastidores para dar no que deu, ficamos então aqui com a pulga atrás da orelha – será que vai mesmo?
Eu, de minha parte, vou jogar as minhas fichas e apostar nesse Leão. Como aluno lembro que deu muito trabalho, mas nunca me decepcionou; como vereador vem dando seu recado há algum tempo; e como presidente eu espero que ele não decepcione o seu eleitorado e que, na medida do possível, dê prioridade zero aos interesses do município e da comunidade, ainda que isso vá incomodar aqueles acostumados a outros tipos de prioridades.
E se o sucesso de sua administração depender de boa educação, bons conselhos e bons exemplos em família, aí eu asseguro, o presidente eleito com certeza é um cidadão na verdadeira concepção da palavra. Já é meio caminho andado.

26 de dezembro de 2006

Orçamento Municipal

Liguei a televisão e dei de cara com a reapresentação da reunião dos vereadores discutindo a aprovação do orçamento 2007. A minha primeira surpresa com os pronunciamentos foi ouvir alguns vereadores pedirem que todos esquecessem as emendas feitas ao orçamento e que o mesmo fosse aprovado do jeito que veio da Prefeitura.
Por conta disso, outros vereadores, supostamente indignados, pois fica difícil saber quem de fato está ali indignado com alguma coisa, usaram em seguida a tribuna para protestar contra a idéia de afogamento das emendas e para dizer que o orçamento da Prefeitura é um monte de coisas, entre elas - uma peça de ficção.
Certo vereador, demonstrando muita irritação, foi à tribuna perguntar aos parceiros sobre o que eles iriam dizer à população, aos eleitores nos seus currais eleitorais e em particular às pessoas e organizações que foram convidadas a discutir o orçamento e apresentar suas idéias e sugestões.
Pasmem! Ninguém soube dizer nada sobre esse questionamento, numa clara demonstração de confiança no velho paradigma – o povo reclama, reclama, reclama, mas depois esquece!...
Um outro vereador, que me pareceu ser o líder da idéia de afogar todas as emendas, resolveu lançar um desafio à inteligência dos colegas. É verdade - acreditem! Propôs reunir todas as emendas num pacote e transformar num “indicativo” a ser encaminhado ao Prefeito de Manaus. Em se tratando de orçamento, até eu, do outro lado da cena, não me contive em acompanhar o riso irônico e disfarçado de alguns parlamentares diante daquela proposta.
Logo em seguida vieram os protestos à idéia do tal “indicativo”. Um vereador subiu na tribuna e mandou o seu recado. Disse, em outras palavras, que se ele (vereador) não conseguia ver concretizada nem mesma as suas emendas consignadas dentro do orçamento que é aprovado pela Câmara, como acreditar que por meio de um simples “indicativo” ao prefeito ia ser diferente? Traduzindo para o português claro, o recado dado ao proponente do indicativo foi o seguinte:
– Pega leve companheiro! Aqui nós até nos fazemos de bobos quando é conveniente, mas não venha querer nos fazer de otários.
Diante daquelas cenas de discussão para aprovar o orçamento, eu me perguntava:
Como é que fica o povo, as comunidades, as entidades e as organizações que foram estimuladas e convocadas a participarem das discussões do orçamento em seus bairros, estabelecer prioridades, etc? Quantos dias e quantas horas essas pessoas dedicaram a esse trabalho, largaram seus afazeres pessoas e domésticos para ajudar a discutir democraticamente o orçamento da cidade? O quê dizer a essas pessoas? Pode não parecer, mas isso é algo que merecia ser pensado e levado mais a sério.
Ora, se os próprios vereadores fazem questão de dizer que o orçamento é uma peça de ficção – por que então iludir as pessoas, principalmente as mais carentes, fazendo-as acreditar que podem sim contribuir e decidir sobre as obras e melhorias das suas comunidades? Pelo que estamos assistindo, nem mesmo os vereadores, legítimos representantes do povo, coitados, conseguem arrumar ou dar palpite em alguma coisa dentro do orçamento. Alguns inclusive assumiram publicamente terem desistido de fazer emendas. Vai ver se cansaram de bancar os bobos ou se renderam em definitivo aos mais fortes. É a opção mais cômoda, mas não deixa de ser uma opção.
Outra coisa a destacar é que a maioria dos atores dessa encenação (aprovação do orçamento) não é marinheiro de primeira viagem. Pelo contrário! Todos sabem como funcionam os bastidores dessa discussão, portanto, têm o dever de preservar o povo de assistir certos vexames explícitos e ao vivo. Do jeito como terminou a discussão do orçamento, como bem disse um dos vereadores, o único penalizado é o povo, ou seja, aquele que além de aturar tudo isso da forma irritantemente pacífica e ordeira, ainda paga a conta.
O certo é que as pessoas estão decepcionadas com os acontecimentos. Os vereadores, quanto mais desculpas arrumam para o vexame das emendas, mais desmoralizados vão ficando.
Uma pequena parcela do parlamento, principalmente aqueles menos comprometidos com a verdade e a ética, com certeza não terão o menor constrangimento de falar aos seus eleitores:
– Não percam a esperança! Fizemos um “indicativo” e vamos todos ao Prefeito cobrar.
Nesse exato momento, plantado lá no meio dos comunitários, alguém vai gritar:
- É isso aí! Palmas para o Doutor!