28 de agosto de 2020

Mano Agostinho...

Hoje, meu mano Agostinho está no berço. Um pouco mais velho do que eu, fomos criados juntos na Getúlio Vargas, já próximo da Ramos Ferreira, numa casa que tinha na entrada o nome de vila, sem ser de fato uma vila – Vila Rosalina. Entretanto, fazia divisão com uma vila de verdade e que existe até hoje - a Vila Mimi.

A casa onde morávamos, toda feita em pedra e madeira, já não existe mais.

Dormíamos no mesmo quarto: eu, mano Agostinho e nosso mano Cláudio de saudosa memória.

De segunda a sexta-feira almoçávamos todos juntos com os nossos avós Manoel e Graziela Ribeiro. Na hora do almoço, uma mesa de madeira de lei envernizada era espichada para poder caber diariamente 9 pessoas, com o vovô Manoel na cabeceira e vovó Graziela à sua direita comandando tudo e dando todas as ordens.

Durante esses dias da semana, e isso por muitos anos, passamos por um verdadeiro castigo gastronômico. Tínhamos que encarar um prato fundo de sopa antes da refeição principal do almoço. Na mesa, com toda a família reunida, quem não tomasse a sopa não podia se levantar da mesa, não tinha direito a reclamar de nada,  nem era servido do prato principal pela vovó Graziela.

Havia uma regra irretratável na mesa do almoço. Ninguém tocava na comida para se servir. A sopa vinha da cozinha já na medida certa para todos. Depois da sopa, vovó servia um a um, começando pelo nosso avô Manoel. Era cumprida uma ordem cronológica. Eu era o penúltimo e minha irmã Diana era a última a ser servida do prato principal. A sopa da Diana, coitada, era sempre a mais salgada. Antes do prato de sopa chegar ela já estava chorando.

O castigo só não era maior por que todo dia era uma sopa de sabor diferente. Mas, tinha aquele dia que era ruim para a maioria. Era o dia de quinta-feira, quando a sopa era de nabo, a preferida de vovô Manoel. Nesse dia todos tomavam a sopa olhando um para a cara do outro, querendo chorar junto com a Diana. Para piorar, era o dia em que o prato principal tinha o que todos gostavam – bife suculento e aquela batata frita feita pela Dedé que comandava a cozinha da casa. Era tudo de propósito, com certeza.

São muitas as histórias para contar vividas com esses manos Agostinho e Cláudio.

Eu nunca tive um irmão de sangue, mas, Deus me deu a felicidade de ser criado com dois seres humanos maravilhosos. Agostinho, que hoje está no berço, e Cláudio, que já não está mais entre nós. Por ser o mais novo dos 3, além do amor de irmão que nos unia, eu tinha a certeza da proteção deles em qualquer circunstância. Nas peladas da turma da rua, ai daquele que tentasse me machucar – o sarrafo comia solto. Quando eu queria sair durante a noite, isso só era possível na companhia de um deles e tinha hora certa para voltar. Eles nunca me deixaram na mão.

A única reclamação que tenho deles era quando saiam para namorar ou para as festinhas  e eu ficava sozinho no quarto de dormir. As noites ficavam mais longas. Como a casa era antiga, as portas batiam sozinhas, o assoalho rangia e o medo ainda me fazia ouvir ruídos e vozes estranhas, o suficiente para não dormir e me cobrir até a cabeça com o lençol. Assim, eu não corria o risco de dar de cara com nenhum fantasma. Eu suava da sola do pé até a cabeça. Quando um deles chegava, eu ouvia o barulho do portão de entrada sendo aberto. Eu  tirava o lençol de cima de mim e fazia de conta que estava tudo bem. Era um tremendo alívio.  Só que muitas vezes esse alívio só vinha depois das 2 ou 3 da madrugada. Se fosse tempo de carnaval, aí eu só ia dormir quando o dia estava amanhecendo e a luz entrava por um janelão que tinha no nosso quarto e dava para os fundos do terreno da casa.

Ao meu mano Agostinho, quero aqui encerrar essa pequena lembrança expressando o meu eterno amor e carinho, desejar-lhe muita saúde, luz, paz, alegrias, realizações e vida longa.