19 de março de 2013

Adolescência feliz!




Na década de 70 eu tinha três grandes divertimentos na minha vida de adolescente: o jogo de bolinhas de gude no barranco do terreno ao lado de casa; a sessão dupla do Cine Guarani aos sábados; a pelada sagrada do sábado depois do cinema no quintal de minha casa ou no campinho do quintal da Dona Chaguinha, na Vila Paraíso; e a brincadeira de empinar papagaio de papel até o céu escurecer nas tardes de domingo, junto com meu pai. 

Para continuar esta história, preciso primeiro falar da casa de meus avós, com quem morávamos na Av. Getúlio Vargas, já próximo da Ramos Ferreira. Nos fundos da casa existiam três quintais bem divididos. No primeiro quintal vovó Graziela criava suas galinhas. Nesse quintal ficavam dois galinheiros de alvenaria e mais um depósito de mantimentos. Na lateral existia um galinheiro todo em madeira, que era o preferido das galinhas de vovó. No meio desse quintal existiam ainda dois velhos coqueiros. No segundo quintal, que chamávamos de quintal do meio, existiam duas cacimbas de águas transparentes que nunca vi igual. Quando faltava água na rua de casa, vovó autorizava os vizinhos a se servirem da água das cacimbas. No terceiro e último quintal, passava um córrego e onde haviam algumas fruteiras que não esqueço: dois pés de goiaba, sendo uma da branca e outra da vermelha, um pé de abacateiro e um pé de abiu. 

Um belo dia, meu tio Manoel, eu e meus irmãos de criação, Cláudio e Agostinho, resolvemos pensar em criar o nosso próprio campinho de pelada. A questão era - onde fazer o campinho? Dos três quintais que tínhamos em casa, o único que oferecia condições de se pensar em fazer um campinho de pelada era o primeiro. Mas, só de pensar nessa ideia dava arrepios. Quem ia ter a coragem de enfrentar vovó Graziela? Eu cheguei a treinar um discurso, mas na hora H faltou coragem.

- Vovó Graziela, a senhora deixa a gente matar suas galinhas, derrubar o seu galinheiro e cortar os seus dois coqueiros? Eu juro que é por uma boa causa! Se a senhora deixar, nunca mais a senhora vai precisar ir me buscar pela orelha na rua ou lá no campinho da vila, pois nos vamos passar a jogar bola aqui mesmo em casa. 

Não sei quanto tempo treinei esse discurso. A verdade é que ele nunca aconteceu. Fico imaginando o que teria sido das minhas orelhas se tivesse encarado esse desafio. Vovó não batia na gente, mas quando se aborrecia com algo, tinha uma maneira especial de segurar e puxar as nossas orelhas com os dedos que não havia jeito da gente escapar.

Na falta de coragem para enfrentar vovó Graziela para pedirmos autorização para acabar com o galinheiro e os coqueiros, resolvemos mudar a estratégia. Como ela havia dado um tempo na criação das galinhas, resolvemos colocar duas traves de madeira no quintal para fazer as nossas peladas. Imaginem uma pelada com três marmanjos de cada lado, um galinheiro na lateral e dois coqueiros no meio. Você driblava o adversário e trombava com o coqueiro; driblava o coqueiro e trombava com o adversário ou com o galinheiro. Era muito divertido! 

Como parte da nossa estratégia, resolvemos fazer as peladas usando a bola de futebol de salão, bem diferente da bola usada nos dias de hoje. Era menor e bem pesada. Cada bicuda em direção ao galinheiro era um estalo. Em menos de dois meses de pelada, todos os sábados e domingos, o galinheiro começou a desabar. Para não correr qualquer risco de que o galinheiro voltasse a ser levantado, tratamos de usar toda a madeira na fogueira da festa junina de São João e Santo Antônio. Todos os anos nessa época nós fazíamos uma festa junina muita animada e não podia faltar a fogueira, uma na porta de casa e a outra no quintal. 

Com o galinheiro detonado e transformado em cinzas, a nossa estratégia voltou-se para os dois coqueiros que já estavam inclusive atacados por brocas. Enormes brocas. Em lugar de eliminar as brocas, a ideia passou a ser alimentá-las, fortalecê-las e multiplicá-las. Quanto mais brocas, melhor para o nosso sonho do campinho de pelada. Os coqueiros já não seguravam mais os frutos e o chão do quintal ficava cheio deles ainda muito pequenos. 

Belo dia, vovó Graziela desceu para conferir a limpeza das cacimbas e parou para olhar a triste situação dos coqueiros. Sem mais nem menos, chamou o empregado que fazia a limpeza das cacimbas e mandou que ele retirasse os coqueiros do quintal. E completou - deixe tudo limpo viu!

Depois dessa ordem, fiquei o resto do dia ansioso esperando meu tio e meus irmãos de criação para dar a boa notícia. Antes que vovó se arrependesse da ordem dada, em menos de 48 horas os coqueiros foram arrancados e o quintal ficou definitivamente livre para se transformar no nosso campinho de pelada. Providenciamos novas traves de madeira, compramos duas bolas novas “dente de leite”, pintamos tudo e marcamos o dia da inauguração. Acreditem! Teve até taça para a equipe campeã. Nome da taça, advinhem, – Graziela Ribeiro. 

A inauguração foi marcada para um dia de sábado e todos os peladeiros da rua foram convidados. Só não contávamos que nesse dia acontecesse um imprevisto com um dos colegas peladeiros, o Dunga, que nos obrigou a transferir a inauguração para o sábado seguinte. Mas esta é outra história, que eu prometo contar depois. 

O campinho de pelada finalmente foi inaugurado no sábado seguinte, desta vez sem imprevistos. Durante um bom tempo esse campinho fez a alegria dos nossos fins de semana, junto com os colegas peladeiros da vizinhança. Tempos bons! Tempos de alegria! Saudade, muita saudade...

Um comentário:

  1. Só faltou contar que eu, sua irmã mais nova e a única menina da turma, era a juiz e apitava o jogo de cima do muro, para não levar bolada na cara... rsrsrsrsrs Tempo bom... muiiiiiiiiiiito bom!! Quanta saudade!

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